1964
Estados Unidos
EventoIdiomas disponíveis
Português
Marcadores
Favelas, Participação
Colaborador
Clara Pignaton/ Diego Mauro
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Realizada pouco mais de trinta anos após a exposição do Estilo Internacional no MoMA de Nova Iorque, a "Architecture without architects (A Short Introduction to Non-Pedigreed Architecture)" aconteceu quase como uma contra-exposição. Bernard Rudofsky apresentou em grandes fotografias em preto e branco um amplo panorama de uma arquitetura ainda não formalizada e tampouco classificada, onde desaparecem os padrões universais e a figura protagonista do arquiteto.
O resgate desse tipo de construção - colocado às margens da história da Arquitetura - aponta para uma reconsideração das particularidades de cada lugar e também para os aspectos da liberdade criativa e espacial que afloravam no contexto social e cultural dos anos Sessenta. Rudofsky questiona o "interesse exclusivo para a nobreza da arquitetura e a arquitetura da nobreza e pelos monumentos que tornavam exemplos únicos dos quais os arquitetos poderiam se inspirar" [RUDOFSKY, 1964: prefácio]. Na falta de um nome já específico, Rudofsky denomina essa arquitetura, de acordo com cada caso, de vernacular, anônima, espontânea, indígena ou rural.
Segundo seu curador, o objetivo da mostra não foi fazer um histórico da arquitetura sem arquitetos e nem estabelecer tipologias, mas sim romper com a sedimentada idéia de arquitetura oficial, comercial e universal e dessa forma oferecer um ponto de partida para a exploração do vasto domínio das idéias que apresenta. Tem a intenção de ser polêmico quando compara, mesmo que sutilmente, a serenidade da arquitetura dos países ditos sub-desenvolvidos e a pobreza arquitetural das regiões industrializadas.
Frequentemente é conferida a essa arquitetura um aspecto de inferioridade, entretanto a investigação de Rudofsky apresenta diversos exemplos de construções de alta qualidade com formas complexas. Muitas de suas invenções e soluções serviram de inspiração para tecnologia atuais, e muitos métodos utilizados hoje já faziam parte do cotidiano da arquitetura vernacular - pré-fabricação, padronização dos elementos componentes, estruturas flexíveis e móveis, aquecimento solar, climatização, regulação da iluminação e até mesmo os elevadores.
A exposição foi uma investigação dessa arquitetura não codificada cujo interesse era expandir a visão limitada que se tinha até então sobre a arte de construir. A intenção de Rudofsky era expor o espectador moderno às diversas possibilidades de concepção de vida na variedade da arquitetura vernácula ou primitiva e criar meios para questionar os padrões pré-estabelecidos.
Bernard Rudofsky, 1964:
"A história da arquitetura ortodoxa acentua a própria arquitetura e sua obra individual e aqui o que nos importa é o empreendimento comunitário - [...] uma arte comunitária produzida não por alguns intelectuais ou especialistas, mas pela atividade espontânea e contínua de um povo inteiro, depositados numa herança comum e obedecendo as lições de um experiência comunal.
[...]
Nós temos muito o que aprender disso que foi a arquitetura antes de se tornar uma arte de especialistas. Em particular, com os construtores autodidatas, que sabem (no tempo e no espaço) adaptar com talento remarcável suas construções ao ambiente. Ao invés de se empenhar, como nós, em dominar a natureza, eles aproveitam ao extremo os caprichos do clima, os obstáculos da topografia. Se um terreno vazio e bem plano nos parece ideal - a passagem de um bulldozer se encarrega de rapidamente eliminar qualquer acidente -, os povos de um gosto mais refinado são atraídos por paisagens atormentadas; eles procuram de preferência locais selvagens, e os mais aventureiros não hesitam em se estabelecer sobre verdadeiros ninhos de águias: Machupicchiu, o Monte Alban, os bastões rochosos da república monástica do monte Athos.
[...]
Autoditadas dos quais as concepções confinam às vezes a utopia e onde a estética sabe se elevar até o sublime. No máximo se atribui a essa arquitetura uma certa beleza - puramente acidental. Hoje, temos que reconhecer que ela é fruto de um raro bom senso encontrado na solução dos problemas práticos: as formas de certas casas, transmitidas às vezes através de cem gerações, parecem eternamente válidas, como são as formas das ferramentas de base.
[...]
Não é paradoxal que para preservar seu equilíbrio físico e mental, o citadino deve periodicamente sair de seu habitat dotado de todos aperfeiçoamentos tecnológicos, para entrar no que ele chama natureza e viver de modo primitivo numa cabana, numa tenda ou se for mais aventureiro, num vilarejo de pescadores ou num burgo fortificado no estrangeiro?
[...]
Os construtores anônimos compreenderam perfeitamente não apenas que eles tinham que marcar os limites da expansão da comunidade, mas que também a arquitetura ela mesma teria seus limites. E é raro que subordinem o bem estar geral na procura do lucro e do progresso. Nesse modo de ver, eles compartilham a convicção do filósofo, porque, segundo Huizinga, 'imaginar que toda descoberta ou que todo aperfeiçoamento contém a promessa de valores mais altos ou de uma felicidade maior carrega uma inocência extrema...' Não é de modo algum paradoxal afirmar que uma civilização poderá terminar por sucumbir a um progresso material"